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Análise: Trump precisa ser racional e cauteloso com os próximos passos

Neste cenário geopolítico, Trump teria, portanto, uma chance histórica de fazer o que nunca fez: ser racional.
EUA ataca Irã, mapa da direção do ataque

É tentador mergulhar na espuma dos dias — especialmente quando a manchete traz “Estados Unidos bombardeiam instalações nucleares iranianas”. O que se joga nesse tabuleiro de mísseis e alianças não é só a estabilidade regional — é o próprio formato do mundo que ainda estamos tentando construir (ou impedir que desmorone de vez).

Para você que está habituado com as posições difíceis deste colunista, não se surpreenda com a postura que eu me colocar aqui. Não sou defensor de Israel nem de Hamas; nem de Trump ou de Putin; muito menos de Estados Unidos ou Irã. Saiba que, se você está disposto a ler e compreender o que direi aqui, você é diferente.


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Desde que Putin decidiu ressuscitar os fantasmas imperiais com a invasão da Ucrânia, e desde que o Irã apertou os gatilhos de seus representantes no Hamas, Hezbollah e outras milícias sob encomenda, a linha de frente da geopolítica deixou de ser apenas geográfica. Estamos diante de uma disputa existencial entre dois modelos de civilização: um que aposta na inclusão e na cooperação, e outro que sobrevive do ressentimento, da opressão e do conflito perpétuo.

O ataque às instalações iranianas deve ser entendido nesse contexto. E, se isso parece grandiloquente, é porque é. Esse não é um confronto entre países, mas entre visões de mundo.

A Ucrânia, ao se aproximar da União Europeia, representava mais do que um alinhamento estratégico: encarnava a ideia de que democracia, prosperidade e independência podem florescer mesmo diante de um “vizinho tóxico”. Israel, por sua vez, estava prestes a selar uma paz estratégica com a Arábia Saudita — a mais impensável das aproximações até outro dia — e talvez, enfim, arrastar consigo os escombros da questão palestina para um novo ciclo de reconstrução. A resposta dos autocratas não tardou.

A questão que paira é: de que lado está Donald Trump? Não retoricamente, mas objetivamente. Porque o mesmo Trump que se gaba de ter matado Qasem Soleimani é também o que ameaça cortar ajuda à Ucrânia, permitindo à Rússia ampliar sua brutalidade. Putin e o regime iraniano não estão apenas alinhados por conveniência; compartilham o projeto de um mundo onde a força suprime o debate, onde a ordem nasce da imposição, e onde uma suposta corrupção estatal é mascarada de soberania. É esse o “mundo seguro” que está em jogo: seguro para teocracias, autocracias e suas oligarquias cleptocráticas.

Trump teria, portanto, uma chance histórica de fazer o que nunca fez: ser racional. Dizer a Netanyahu para sair de Gaza, permitir uma missão árabe de paz, pressionar por uma Autoridade Palestina reformada, suspender os assentamentos na Cisjordânia e, por fim, encarar a ideia de dois Estados com o mínimo de seriedade. Mas isso exigiria visão de estadista — e não de animador de comícios.

A bomba que caiu sobre o Irã atinge não só seus alvos subterrâneos terrenos, mas também o moral de um mundo que está sempre à beira de normalizar o inaceitável. A pergunta real não é “quem começou?” ou “quantos morreram?”. É: quantos ainda estão dispostos a defender a possibilidade de um mundo menos hostil, menos cínico e menos explosivo? Porque entre uma usina nuclear e uma urna democrática, não deveria haver escolha difícil.


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Autor

  • Iago Yoshimi Seo

    Jornalista de profundidade, autor do livro A Teoria de Tudo Social: Democracia LTDA., ambicioso por política e debates

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