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Opinião: A nova Lava Jato vai de toga ou de aposentadoria?

A resposta mais sensata seria ambas, mas o Brasil não é país para sutilezas. A Lava Jato, com todos os seus excessos e vícios, foi um marco.
Opinião: A nova Lava Jato vai de toga ou de aposentadoria? (Foto: Geração automática)

A Polícia Federal está diante de duas frentes explosivas: uma que perfura os alicerces do Judiciário e outra que sangra o sistema previdenciário nacional.

A primeira atende pelo pomposo nome de Operação Sisamnes — em alusão ao juiz persa esfolado vivo por vender sentenças. A segunda gira em torno de um “mensalão previdenciário” que atravessa os governos e supostamente entope os bolsos de parlamentares com dinheiro da aposentadoria alheia. Qual das duas tem mais potencial de se tornar a nova Lava Jato?


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A resposta mais sensata seria: ambas. Mas o Brasil não é país para sutilezas. Por aqui, ou se esfolam juízes — metaforicamente, ao menos — ou se desmonta um esquema previdenciário à base de estelionato institucionalizado. O problema é que, numa nação viciada em escândalos, só sobrevive no imaginário público aquele que junta os ingredientes certos: poderosos implicados, cifras indecentes, narrativa palatável e — fundamental — continuidade processual. Nesse ponto, o Judiciário costuma jogar com vantagem: é ao mesmo tempo réu, juiz e, muitas vezes, protagonista oculto.

A Operação Sisamnes, até aqui, tem todos os elementos de um terremoto de toga. Auxiliares de ministros do STJ afastados. Advogados influentes sob suspeita. Sentenças que teriam sido compradas como quem negocia vaga de garagem. Dinheiro lavado via mercado imobiliário. Um ex-presidente da OAB envolvido. Uma rede clandestina de espionagem jurídica que fornecia acesso privilegiado a investigações da própria PF. Tudo isso em um Judiciário que jura, entre colunas de mármore e latinismos, ser o último bastião da moralidade institucional. 

Polícia Federal Deflagra 7ª fase da Operação Sisamnes (Foto: Reprodução / PF)
Polícia Federal Deflagra 7ª fase da Operação Sisamnes (Foto: Reprodução / PF)

Quando Montesquieu pressupôs a tripartição dos poderes, procurou calçar o seu argumento na descentralização do poder soberano à sociedade, mas nunca desenvolveu sua tese sob a intrínseca cultura social e o funcionamento institucional sob tal. Talvez ele ficasse em choque vendo o que se tornou o institucionalismo brasileiro. Da monarquia, passando por regimes ditatoriais de exceção, democracia indireta, até a plena redemocratização, a sociedade brasileira nunca se mostrou politicamente apta ao exercício do poder político-institucional. O horizonte de poder é muito sedutor para um povo cujo a cultura é achar graça em fazer gringo falar palavrão, um povo da cultura do “vantagismo”, do corta caminho e da gambiarra.

Mas não se deve subestimar o escândalo do INSS. Uma fraude bilionária com rosto popular, que envolve dados sensíveis de idosos, aposentados e pensionistas — justamente a parcela mais vulnerável da população. O desvio, nesse caso, é duplamente cruel: captura recursos públicos e, de quebra, ainda revitimiza quem já depende de um sistema inchado, ineficiente e agora sabidamente corrupto a essa altura. E como toda boa organização criminosa à brasileira, também este caso promete delações. Gente disposta a “abrir o bico”, como já se diz por aí. O estrago, nesse caso, tende a ser amplo, geral e multipartidário.

A Lava Jato, com todos os seus excessos e vícios, foi um marco não só jurídico, mas cultural: deslocou o centro da política nacional para dentro de uma sala de audiências. Para que uma nova operação chegue a esse patamar, será preciso mais do que manchetes. Será preciso continuidade, robustez processual e — o mais difícil — respaldo institucional.

Por ora, o que se vê é uma Justiça que investigará a si mesma de maneira hesitante, e um Congresso que tentará abafar, em nome de acordos inconfessáveis, qualquer CPI que se aproxime de sua caixa de segredos. Enquanto isso, o país assiste. Cético, talvez, mas não surpreso.


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Autor

  • Iago Yoshimi Seo

    Jornalista de profundidade, autor do livro A Teoria de Tudo Social: Democracia LTDA., ambicioso por política e debates

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