O que une história, geografia e uma paixão pela cidade? Para o jornalista Ronaldo Tarallo Júnior, de 24 anos, é a oportunidade de dar vida aos nomes que estampam as placas de ruas de Santos em um projeto on-line: o ‘Vias de Santos‘.
Dar voz às ruas e resgatar a história que elas carregam são alguns dos principais objetivos, além, é claro, de poder apresentar de forma simples as origens dos nomes e as histórias escondidas nas vias santistas.
Além disso, Ronaldo inclui curiosidades sobre o passado, fotos atuais e antigas, e até mapas, criando uma conexão emocional com os moradores.
A iniciativa já conquistou centenas de seguidores que redescobrem a cidade sob uma nova perspectiva.
Como tudo começou
Em 2019, enquanto trabalhava no IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), na atualização territorial do município para o Censo, Ronaldo começou a se interessar pelos limites dos bairros e pelas histórias por trás das ruas.
Na agência, encontrou o livro ‘Veja Santos’, de Olao Rodrigues, que trazia nomes e histórias de ruas até os anos 1970. Foi ali que a semente do “Vias de Santos” começou a germinar.
Com o ingresso no curso de jornalismo em 2020, o interesse se aprofundou. Cada placa de rua despertava perguntas como “Quem foi aquela pessoa homenageada?”. Em alguns casos, a resposta vinha em uma ‘linha fina’ explicativa; em outros, era preciso buscar além da superfície.
A curiosidade transformou-se em um hobby: Ronaldo passou a conferir leis e registros históricos para entender os nomes.
História preservada
A grande virada ocorreu em 2023, quando começou a estagiar na Diretoria de Comunicação da Prefeitura de Santos. Uma matéria sobre a história dos bairros revelou o domínio de Ronaldo sobre o tema.
Ao se tornar referência informal nos bastidores, ele encontrou as fontes corretas para investigar o que e quem deram origem às ruas.
No mesmo ano, uma polêmica acendeu o que faltava para o nascimento do projeto: a mudança do nome da Rua Guaiaó para Alameda Armênio Mendes gerou protestos dos moradores e indignação em Ronaldo.
“Guaiaó significa ‘Ilha de São Vicente’, local onde fica Santos”, explica. A troca, segundo ele, demonstrou desconhecimento histórico. Foi o estopim para a criação do “Vias de Santos”, idealizado para preservar memórias e evitar que histórias como essa se perdessem.
Pesquisa árdua
Com o fim do estágio e o diploma em mãos, Ronaldo começou a moldar o projeto nas redes sociais.
Em abril de 2024, fez sua estreia no Instagram com um post sobre a Rua Tiradentes. A partir daí, cada rua ganhou espaço por critérios como relevância histórica, curiosidades ou datas comemorativas. Em maio, por exemplo, todas as homenagens focaram em personalidades abolicionistas, especialmente santistas.
A pesquisa, minuciosa, parte de fontes como o site Novo Milênio, que reúne publicações históricas, e leis municipais que oficializam os nomes.
Ronaldo verifica os dados na prefeitura e mergulha na história das personalidades homenageadas. E para complementar, busca registros na Fundação Arquivo e Memória de Santos (FAMS), onde encontra fotos antigas, mapas e documentos.
Pertencimento e memória afetiva
Um diferencial do projeto é o formato dinâmico e interativo. Além de contar as histórias dos nomes, Ronaldo contextualiza a própria rua: seus antigos nomes, o que já existiu ali, e curiosidades do passado.
As fotos são atuais, capturadas por ele, e dialogam com imagens históricas que provocam nos seguidores uma sensação de pertencimento e memória afetiva.
O impacto do “Vias de Santos” não se limita às redes sociais. Ronaldo também escreve uma coluna semanal em um tradicional jornal local, onde aprofunda as histórias que publica on-line.
“Quero que os santistas entendam que as ruas que percorrem diariamente são mais do que trajetos. Elas têm memórias, significados e vidas que moldaram nossa cidade”, diz ele.
Benefícios do estudo
“Todo mundo quer saber um pouco quem foi quem, principalmente das ruas que convivemos mais”, comenta a professora de Arquitetura e Urbanismo, Fernanda Faria Meneghello.
Segundo ela, a ‘Toponímia’, estudo dos nomes das ruas, como apresentado por Ronaldo na página de pesquisa, contribui para aprofundar o entendimento sobre o território e a história da cidade.
Essa relação entre a nomenclatura e o uso do espaço, de acordo com ela, é um reflexo direto da forma como as cidades foram sendo configuradas ao longo do tempo.
“São traçados que determinam o fluxo e a funcionalidade das vias, e também influenciam diretamente na ocupação do território. Entender esses detalhes amplia a compreensão da relação entre a infraestrutura e o cotidiano de quem vive na cidade.”
Entenda as expressões geográficas
Consultada pela VTV News, a professora traduziu e explicou alguns termos relacionados à divisão e nomeação de áreas urbanas, presentes na página ‘Vias de Santos’. Confira:
Divisões e Nomenclaturas Geográficas
Município – Unidade territorial básica do Brasil, prevista na Constituição Federal, com autonomia administrativa, política e financeira.
Região Metropolitana – Agrupamento de municípios próximos, organizados para integração econômica e social, definidos por lei estadual.
Bairro – Divisão interna do município, relacionada à identidade cultural e histórica local. Os bairros são delimitados no Plano Diretor Municipal e registrados em uma planta chamada bairramenta.
Zona – Divisão do município para fins de organização territorial e planejamento urbano, como: Zona da Orla, Zona Central e Zona Portuária.
Nomenclatura Viária
Vias – Espaço público destinado ao trânsito. Quando baseado em largura e função, tem divisões técnicas como ‘Rua‘ (espaço público linear, geralmente com duas calçadas, destinado ao trânsito local, com velocidade reduzida) e ‘Avenida‘ (via projetada para alto fluxo de veículos, com múltiplas faixas, calçadas largas e velocidade mais alta). Também pode se classificar em:
- Via Local – Destinada ao tráfego de baixo volume, geralmente em áreas residenciais.
- Via Coletora – Conecta vias locais a vias arteriais, suportando um fluxo moderado de veículos.
- Via Arterial – Destinada a grandes volumes de tráfego, conectando diferentes partes da cidade.
Rodovia – Vias de trânsito rápido, utilizadas principalmente para conexão entre cidades.
Travessa de Pedestres – Via destinada exclusivamente ao trânsito de pedestres.
Técnicas e Processos de Planejamento
Plano Diretor Municipal – Documento que organiza o desenvolvimento urbano do município, incluindo a delimitação de bairros, zonas e classificações viárias.
Bairramenta – Planta do município que detalha os bairros existentes e pode ser alterada conforme a necessidade.
Zonamento – Regulamentação do uso do solo, estabelecendo o que pode ser construído ou implantado em cada zona.
Caixa Viária – Largura total da via, incluindo a pista, calçadas e outros elementos viários, utilizada para definir o uso e ocupação do entorno.
Coeficiente de Aproveitamento – Índice que define a quantidade máxima de construção permitida em um terreno.
Índice de Ocupação – Percentual da área do terreno que pode ser ocupada por edificações.