O ano de 2024 está terminando e a maioria das pessoas que conheço começa a fazer as intermináveis listas de erros e acertos do ano que se finda, e outra para as resoluções e promessas para o ano que se inicia.
Listas que refletem nossas intenções de não cometer os mesmos erros do passado e promessas para nos tornarmos pessoas melhores no futuro. Ou seja, um pacote de boas intenções que muito provavelmente não durarão mais que uma semana como acontece em todos os anos.
Mas voilá, nada como alimentar a alma com um pouco de esperança e fé de que o mundo, e nós mesmos, podemos ser um pouco melhores do que já fomos um dia.
Se a cada efeméride anual cumpríssemos 1% de nossas promessas ou evitássemos cometer os mesmos erros na mesma proporção, certamente estaríamos numa posição pessoal muito melhor; mas os seres humanos são o que são, e as listas servem,quando muito, como fórmulas baratas e modernaspara o autoengano.
Basta passar alguns dias do ano novo que se avizinha e lá estamos nós, cometendo os mesmos erros, perdendo a paciência com nossos amigos e familiares da mesma forma, e retornando ao nosso “status quo” de seres imperfeitos, erráticos, e sem muita empatia com o nosso semelhante.
Mas que nosso leitor não desanime, talvez, esse jogo de “tentativa, erro e acerto” que o cotidiano insiste em nos apresentar, dia após dia, seja o grande mistério ou desafio da vida.
É esse esforço diário de tentar melhorar, aprender com erro e tentar melhorar novamente, a grande lição que muitos de nós relutam em aprender. Uma lição de difícil aprendizagem, mas que ninguém escapa de forma ilesa.
Outro dia ouvi de um amigo psicólogo que todos nós, seres humanos, buscamos, indubitavelmente, não importa o gênero, idade, cor, classe social ou país onde moramos, três desejos simples: a fuga da dor, a busca do prazer e a saciedade da fome. Somos seres simples com desejos atávicos de sobrevivência. Simples assim.
Olhando sob essa perspectiva, nossas listas de promessas futuras ou nossas retrospectivas do ano que se finda,não deixam de ser uma armadilha psicológica onde desejamos, quando muito, sair da nossa zona de conforto para sermos pessoas mais justas e melhores num mundo cada vez mais cruel.
Tenho escutado de amigos próximos e familiares que o ano de 2024 foi um ano bastante desafiador. Para mim especificamente foi um ano difícil. Voltei ao Brasil, após longos 9 anos sem pisar em terras tupiniquins para estar e ajudar minha mãe de 85 anos que caiu e acabou por quebrar o fêmur e o cóccix.
Como podem imaginar a tarefa de reabilitação dela não tem sido nada fácil. Quanto a mim, que acabo de chegar em Terras Lusas, após passar dois longos meses no Brasil, não poder acompanhar esse processo de perto tem sido bastante preocupante.
Se minha experiência em terras brasilis foi dolorosa, e de certa forma intensa, percebi, tristemente, nessa longa estadia, que nem todos nós, familiares e amigos, conseguem exercitar a empatia que dizemos ter um pelo outro, e assim confirmamos uma parte da tríade do ditado ao evitar experienciar a dor daqueles que amamos.
Envolver-se e estar ao lado de quem não está bem ou passa por um período difícil exige coragem e desprendimento, mesmo que essa experiência dispare em nós um alerta e um medo profundo de que essa dor e fatos indesejados podem, também, nos acontecer um dia.
Muitos preferem negar essa realidade e ajudar quem sequer conhecemos com seus trabalhos voluntários e doações que alardeamos em alto e bom som. Afinal dessa maneira acreditamos sermos boas pessoas de verdade. Nada como ficar bonito na “foto da vida” e implorar pela validação alheia.
Mas se andar nesse deserto pode ter tido algum aprendizado que ainda não descobri ou assimilei de fato, encontrar algumas pessoas que me apoiaram e dedicaram sua atenção nesse caminho foi um antídoto contra a depressão e a sensação, muitas vezes decepcionante, de que o mundo, e as pessoas não valem a pena.
Na realidade, todosnós estamos cumprindo a nossa saga pessoal sem nenhum controle aparente e isso nos assusta e muito. Somos reféns do acaso e do destino que nos cabe e daquele que ainda está por vir.
Portanto, caro leitor desejo ardentemente que sua retrospectiva tenha sido leve e que os seus acertos tenham sido muito mais expressivos do que seus inevitáveis erros; torço também que sua lista de boas intenções e promessas futuras seja longa o suficiente para que possa executá-la muito mais que um por cento.
O importante mesmo é seguir em frente e tentar, dentro do possível, errar o menos possível, amar o próximo e ser feliz. Feliz Ano Novo.