Quem acompanha a coluna semanalmente ou, ainda, a política em Portugal, sabe que desde o dia 18 de maio último há um novo governo constituído.
Se as eleições antecipadas intencionavam uma virada à esquerda com a destituição do governo da AD, liderado pelo primeiro-ministro Luís Montenegro, os resultados das urnas mostraram exatamente o contrário.

Pela primeira vez na história, o partido socialista PS, presidido por Pedro Nunes Santos, nunca obteve tão poucos votos nas urnas, e passou a ocupar o terceiro lugar na Assembleia, perdendo espaço e prestígio para o partido Chega, capitaneado por André Ventura, que passa a ser o maior partido de oposição ao novo governo.
Se os resultados das eleições sinalizaram uma virada à direita, a sociedade portuguesa, a maioria dos comentaristas políticos e uma grande parte da elite cultural viu-se perplexa com o crescimento da extrema direita no país.
Histerias à parte, não me parece que os resultados foram assim tão surpreendentes ou que a maioria da sociedade portuguesa foi pega de surpresa.

Apesar de Portugal ser um país pobre, e da pecha que recai sobre a maioria dos eleitores portugueses de não ser esclarecidos politicamente, acredito, piamente, que o povo português tem capacidade suficiente para ler a sociedade em que vive e fazer as suas escolhas políticas com bom senso.
Motivos e alertas para essa suposta “reviravolta” não faltaram. Após 8 anos de governo socialista e uma lista infindável de escândalos, era mais do que previsível essa mudança de curso, ou pelo menos, esperada uma perda expressiva de votos do PS nas legislativas.
Entre os escândalos do governo socialista, e que são em grande parte responsáveis pelo vexame do dia 18, vale a pena lembrar: o assassinato de um cidadão ucraniano dentro das repartições do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras -SEF, o atropelamento de um trabalhador português por um carro do governo que trafegava em alta velocidade em uma estrada nacional, a tentativa de cárcere privado de um funcionário do governo dentro do Ministério das Infraestruturas, a concessão de uma indenização milionária para uma dirigente da TAP e, por fim, a política de imigração de portas abertas que acabou por fragilizar ainda mais os já frágeis, e débeis, serviços públicos portugueses.
Acresça-se a tudo isso, o apático desempenho de Pedro Nunes Santos na campanha eleitoral, que preferiu ocupar seu espaço público para acusar seus concorrentes e não mostrar soluções viáveis para o país.

E ainda, um incidente de saúde, nos últimos dias de campanha, do líder do Chega, que se não serviu para angariar mais votos para o partido, pelo menos, humanizou seu líder aos olhos dos portugueses. Nada mal para quem é sempre acusado de fascista, xenófobo e racista.
Diante desse caos de “casos e casinhos” que marcaram os 8 anos da gestão socialista, bastou ao líder da AD, Luís Montenegro, não cometer tantos erros na campanha e ressaltar que o seu governo não teve tempo suficiente para que as mudanças propostas, nesse quase um ano de governo, surtissem o efeito desejado.
Dito isso, o primeiro-ministro já foi indigitado e, ontem, dia 4 de junho, os Ministros do novo governo apresentados. No rescaldo desse novo capítulo, uma coisa é certa. Sem maioria absoluta no Congresso, Luiz Montenegro vai ter que fazer concessões, se não à esquerda, certamente o fará, vez ou outra, e muito a contragosto, com a bancada do Chega.
E aqui o busílis, a meu ver, será como o atual primeiro-ministro irá conduzir a política de restrição à imigração, uma vez que os portugueses já estão fartos de tantos imigrantes e querem que algo de relevante e restritivo seja feito o mais urgentemente possível.
Afinal, foi essa a tática que a AD usou dias antes das legislativas ao anunciar aos portugueses que expulsaria 1.800 imigrantes ilegais de Portugal e, assim, aliciar alguns eleitores do Chega para a AD.
Hoje, nem 20 dias pós eleição, os números de expulsão ultrapassam os 5 mil. De duas, uma: ou Montenegro acena ao Chega com mais restrições à imigração ou corre o risco de perder eleitores para André Ventura num futuro mais próximo do que se imagina.