A Justiça de São Paulo determinou, em uma decisão liminar recente, do Tribunal de Justiça do Estado que o Centro de Referência da Saúde da Mulher realize abortos legais em casos que resultem em gestações por causa da retirada sem consentimento do preservativo durante a relação sexual.
A juíza Luiza Barros Rozas Verotti reconheceu que a prática, conhecida como stealthing, é uma violência sexual análoga ao estupro.
A magistrada também destacou que a falta de unidade de saúde de referência para realização do procedimento representa “risco de inúmeras gestações indesejadas decorrentes de violência sexual prosseguirem, com drásticas consequências à saúde física e mental da mulher”.
A decisão atendeu a uma ação popular iniciada pela Bancada Feminista do PSOL na Câmara Municipal de São Paulo e na Assembleia Legislativa de São Paulo. A ação ainda não tem data prevista para julgamento.
A Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo (SES-SP) informou que não foi notificada da decisão e, tão logo isso ocorra, cumprirá integralmente os termos da liminar.
Esta descisão traz à tona um tema ainda pouco discutido nas esferas jurídicas e sociais: o stealthing, uma prática sexual em que o parceiro retira o preservativo durante a relação sem o consentimento da outra pessoa.

O Que é Stealthing?
O termo “stealthing” surgiu como uma forma de descrever o ato de desproteger a parceira ou o parceiro durante o sexo, retirando o preservativo sem o consentimento da outra parte. A prática é considerada uma violação de consentimento sexual, pois não apenas infringe o direito da pessoa a decidir sobre o uso de métodos contraceptivos, mas também coloca em risco a saúde da vítima, aumentando as chances de transmissão de doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) e gerando a possibilidade de uma gravidez indesejada.
Embora o stealthing tenha sido reconhecido como uma forma de agressão sexual em vários países, no Brasil, o debate sobre a legalidade e as consequências jurídicas dessa prática ainda estava em fase de amadurecimento. Recentemente, um tribunal de São Paulo reconheceu que o ato pode ser classificado como uma violência sexual, considerando a violação do direito ao consentimento.
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A Decisão Judicial e o Direito ao Aborto Legal em casos de Stealthing
A decisão do tribunal paulista ocorre no contexto de uma mulher que, após ser vítima de stealthing, ficou grávida. A Justiça, ao reconhecer que a prática configura uma violação do consentimento sexual, autorizou a mulher a realizar o aborto legal, sem a necessidade de passar pelos trâmites habituais, como comprovação de risco à saúde física ou psicológica.
De acordo com a Lei nº 12.845/2013, a interrupção da gravidez é permitida no Brasil em casos de:
- Anencefalia do feto;
- Risco à saúde da mãe;
- Casos de estupro.
A prática de stealthing, por se configurar uma forma de agressão sexual, entra na categoria de violência sexual, o que garante à vítima o direito de decidir sobre a interrupção da gestação.
Stealthing: repercussão internacional sobre o tema
O stealthing tem gerado crescente preocupação global, sendo alvo de discussões em diversos países. Em 2021, a Suíça se tornou o primeiro país a criminalizar a prática, e outros lugares, como os Estados Unidos, também começaram a discutir formas de regulamentar e punir tal conduta.
No Brasil, embora a prática não seja especificamente criminalizada ainda, o entendimento do tribunal paulista abre um caminho para que novas legislações possam ser propostas e aprovadas, visando proteger as vítimas de agressões sexuais dessa natureza.