Por decisão unânime no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), o barbeiro Pablo Santos Silva, de 19 anos, foi solto nesta quarta-feira (11), após ser condenado injustamente a quase oito anos de prisão. A defesa comprovou que ele estava cortando o cabelo no momento do roubo, ocorrido em Praia Grande, na Baixada Santista.
O crime aconteceu em 26 de outubro de 2024, na Avenida Presidente Castelo Branco. Três assaltantes, um deles armado, roubaram um homem, de 34 anos, e uma mulher, de 24. Pablo foi detido pela Guarda Civil Municipal (GCM) três horas depois, junto com um adolescente, 15, após ser identificado pelas vítimas de forma irregular.
Pablo havia sido condenado em primeira instância a sete anos e oito meses de reclusão, em regime semiaberto. Contudo, na segunda-feira (9), o TJ-SP anulou a condenação, alegando ausência de flagrante, reconhecimento equivocado e provas consistentes de que o absolvido estava em outro lugar no momento do crime.
“A prisão não tinha base legal, o reconhecimento tinha sido feito de forma totalmente irregular e, o mais grave de tudo isso, é que haviam provas contundentes de que [o Pablo] não estava no local do crime”, disse o advogado responsável pela defesa, Renan Lourenço, ao VTV News.
Prisão
As vítimas estavam na orla da Praia da Guilhermina quando tiveram três celulares roubados, por volta de 19h40. À polícia, o homem e a mulher descreveram como responsáveis três homens negros, que usavam roupas escuras e capuzes. Pablo foi detido, e o adolescente apreendido, próximo à meia-noite, no bairro Antártica.
Segundo a ocorrência, GCMs rastrearam o GPS de um dos celulares roubados até uma adega, mas não entraram devido a um grande número de pessoas no local. Pablo e o adolescente foram, então, abordados nas proximidades – a quase 4 km do crime. Entretanto, nenhum item roubado ou arma foram encontrados.
Na inspeção policial, os agentes tiraram fotos dos suspeitos e enviaram às vítimas pelo WhatsApp, prática irregular segundo o Código de Processo Penal e a Resolução 484/2022 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Ainda assim, foram reconhecidos como supostos autores e conduzidos ao Plantão Policial para depoimento.
Em audiência de custódia, realizada em 27 de outubro de 2024, foi decretada a prisão preventiva de Pablo. Ele foi acusado de roubo qualificado e corrupção de menores. Já o adolescente foi apreendido por ato infracional equivalente ao roubo e encaminhado à Promotoria da Infância e Juventude.

Álibi
A família de Pablo conseguiu acessar conversas de WhatsApp no celular dele, mostrando um convite de um amigo barbeiro para cortar o cabelo às 19h. Câmeras de segurança registraram Pablo saindo de casa às 19h13 e retornando às 20h24 – os horários coincidem com a alegação de que ele não estava na cena do crime.
Após cortar o cabelo, Pablo tirou uma foto às 20h07, que ficou salva em seu celular. A imagem, registrada na barbearia, mostrava sua camiseta com detalhes vermelhos, azuis e brancos – diferente da descrição de roupas totalmente pretas fornecida pela polícia. O crime, por sua vez, aconteceu na Guilhermina.
Na ação, a defesa argumentou que a prisão foi feita com base em características genéricas, como cor de pele e vestimenta, e em um reconhecimento falho, sem provas concretas. Para o advogado Renan Lourenço, esses detalhes reforçaram que não havia evidências suficientes para vincular Pablo ao roubo.
O advogado também criticou a abordagem da polícia. “Causa estranheza que a polícia não tenha ido ao local onde estaria o celular da vítima, uma adega cheia de pessoas, mas tenha optado por prender [Pablo e o adolescente] próximo a uma escola, perto de tal adega, a esmo”, destacou.

Impacto emocional
Apesar de apresentar provas desde o início do processo, a defesa só conseguiu reverter a condenação após sustentação oral no TJ-SP. Segundo o advogado, o juiz da primeira instância ignorou os documentos que demonstravam inconsistências nas provas e condenou o jovem injustamente.
Amanda de Jesus Santos, mãe de Pablo, relatou o impacto emocional após esperar até quase 3h da manhã por respostas. “Foi difícil chegar na delegacia e não poder ver meu filho. As explicações não batiam, e eu percebi que tinha algo errado”, disse ela à VTV, emissora afiliada do SBT na Baixada Santista.
Em entrevista ao repórter Fernando Degaspari, nesta quinta (12), Pablo descreveu o choque ao ser preso com base em um reconhecimento fotográfico. “Ela disse que era eu pelo tom de pele e aparência. Passei oito meses preso por algo que não fiz. Nunca vou esquecer essa injustiça”, desabafou o jovem.
Amanda prometeu lutar por justiça e destacou o preconceito racial enfrentado pelo filho. “Eu não vou deixar isso impune porque não é o primeiro caso nem vai ser o último. Não é porque meu filho é de cor negra que ele vai pagar por algo que não fez. Independemente da raça, a gente não pode julgar as pessoas”, afirmou.