Em ano eleitoral, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está entre os nomes cogitados para se tornar enredo da Acadêmicos de Niterói, que estreará no Grupo Especial do carnaval carioca em 2026. A informação foi confirmada pela assessoria de imprensa da escola de samba, que afirma considerar três possíveis temas para a apresentação do próximo ano.
A Acadêmicos de Niterói conquistou o título da Série Ouro no último carnaval e garantiu vaga na elite do desfile do Rio. Em nota, a agremiação anunciou que o enredo será revelado no próximo dia 9 de julho, com desenvolvimento assinado pelo carnavalesco Tiago Martins e sua equipe.
Esta não seria a primeira vez que Lula protagoniza um desfile carnavalesco. Em 2003, a Beija-Flor de Nilópolis levou a história do petista à Marquês de Sapucaí e conquistou o título do carnaval carioca daquele ano, com enredo centrado em temas sociais e combate à fome. Já em 2012, foi a vez da Gaviões da Fiel, em São Paulo, homenageá-lo. À época, o presidente não compareceu ao desfile por estar em tratamento contra um câncer, mas enviou um vídeo de agradecimento à escola.
Lula enredo de escola de samba? Possível implicação eleitoral
A eventual escolha do presidente como tema de enredo levanta questionamentos sobre a legalidade da homenagem em ano eleitoral. João Marcos Pedra, sócio fundador da Carvalho Pedra Advocacia e Secretário Geral da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-DF, afirma que a legislação brasileira distingue pré-candidatos de candidatos formais, o que permite manifestações artísticas durante o período do carnaval.
“Ao mesmo tempo que a legislação proíbe a propaganda eleitoral antecipada, a Constituição protege o livre direito de manifestação artística”, explica. Para ele, manifestações culturais como o carnaval — tradicionalmente marcadas por crítica social e política — gozam de respaldo constitucional.
Porém o especialista alerta que, caso haja um patrocínio ou promoção da ideia por parte do Presidente da República, ele poderá ser responsabilizado por propaganda eleitoral antecipada.
Precedentes jurídicos
Segundo o especialista, dois julgamentos anteriores no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ajudam a delimitar os contornos da discussão. Em 2018, o cantor Roger Waters criticou o ex-presidente, Jair Bolsonaro, em um show. O então candidato processou Fernando Haddad e Manuela D’Ávila por abuso de poder econômico, mas a Corte rejeitou a ação, entendendo que os políticos não podiam ser responsabilizados pela manifestação do artista.
Já em 2022, o TSE determinou multa e proibição de manifestações políticas no festival Lollapalooza, após artistas como Pabllo Vittar e Marina declararem apoio a Lula durante as apresentações. Nesse caso, o Tribunal entendeu que houve pedido explícito de voto, configurando propaganda irregular.
Tensões entre arte e política
Segundo o sociólogo Paulo Niccoli Ramirez, da FESPSP, as escolas de samba possuem vínculos históricos com movimentos sociais e pautas políticas, o que naturalmente se reflete em seus enredos. Para ele, a escolha de Lula como tema dialogaria com preocupações presentes na cena cultural, especialmente diante de ciclos políticos que impõem cortes a programas sociais e projetos culturais.
Caso a homenagem se concretize, o precedente pode se tornar objeto de judicialização. Até lá, a Acadêmicos de Niterói mantém o sigilo sobre sua escolha.