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Desordem Natural: Região de Campinas registrou mais de 17 mil autos de infração ambiental

Especialistas chamam de reflexo do negacionismo; forças policiais se preparam para período de estiagem
Região de Campinas registra diversas ocorrências contra o meio ambiente (Foto: unsplash)

Em meio às mudanças climáticas, a região de Campinas registrou, de 2017 até 2025, mais de 17 mil autos de infração ambiental. O número corresponde a cerca de 10% de denúncias em todo o Estado de São Paulo. São 1.889 casos por ano.

A humanidade está alterando o meio ambiente com processos de desmatamento, queimada e expansão urbana. Tais ações têm consequências e os dados reunidos pela Coordenadoria de Fiscalização e Biodiversidade do Estado de São Paulo demonstram isso. Segundo dados da coordenadoria através do SIPAIGeo Público, o Estado de São Paulo registrou, de 2017 até 2025, 177.059 autos de infração ambiental. A maioria das denúncias são contra a flora, fauna e pesca.


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Autos de Infração em Campinas e região

  • Na região administrativa de Campinas, composta por cerca de 90 cidades, ao longo dos 9 anos compilados, foram registrados 7.498 autos de infração contra a flora, correspondente a 9,32% do total de registros no estado. Já contra a fauna, foram registrados 5.399 casos, correspondente a 11,09%.

  • Os tipos de infração ambiental mais comum contra a flora são de: intervenção em área de preservação permanente – impedir, dificultar a regeneração natural (2.838); destruir, danificar objeto especial de preservação (1.702); e destruir, danificar ou utilizar a vegetação (1.242).

  • Já contra a fauna, a maioria é dos casos na região de Campinas são de: adquirir, guardar, ter em cativeiro um animal silvestre (3.762), seguido por maus-tratos contra animais domésticos (414).

Dessas 90 cidades compiladas pela plataforma estatística, o 5º Batalhão da Polícia Militar Ambiental, da 1ª Companhia, monitora 38. Dentre as cidades fiscalizadas estão, Bragança Paulista, Campinas e Atibaia. Conforme o levantamento do jornal, 264 autos de infração foram lavrados contra a fauna dessas cidades, e 432 contra a flora. Os números são referentes a 2024.

Em entrevista exclusiva à VTV, o Capitão Ventrone do 5º Batalhão da Polícia Militar Ambiental, e recém-chegado à região de Campinas, comenta sobre as infrações mais comuns presenciadas ao longo da carreira e na região.

Pós-graduado em Educação Ambiental e Neurociências na Infância, Ventrone comenta que, pela sua experiência, “queimadas naturais são muito difíceis de ocorrer”. O capitão relembrou o período de queimada e estiagem no estado de São Paulo em 2024, e que se tratou de um fenômeno ímpar na sua carreira.

“Em 2023, nós tivemos R$250 mil de multas nas autuações [infrações ambientais], mas em 2024, tivemos cerca de R$10.8 milhões. Ano passado foi de fato um recorde”, disse o capitão Ventrone.

Capitão do 5º Batalhão da Polícia Militar Ambiental, Cléber Ventrone (Foto: Iago Seo)

Queimadas no estado, causas e prevenções

“As queimadas do ano passado foram reflexo da crise climática, assim como o período de seca”, disse Bruna Locardi, delegada intermunicipal eleita para estar na 5ª Conferência Nacional do Meio Ambiente em Brasília, prevista para ocorrer em maio.

Segundo a ONG MapBiomas, a Mata Atlântica perdeu cerca de 1 milhão de hectares para as chamas entre janeiro e dezembro de 2024. Segundo o levantamento, 70% da área afetada está localizada em setores agropecuários, e a área atingida em 2024 supera a soma da área queimada entre os anos de 2019 a 2023. Somente no Vale do Paraíba, uma área de aproximadamente 372 campos de futebol foram perdidos.

O capitão Ventrone explicou à reportagem sobre a dinâmica da queima criminosa: “Quando começa um foco de incêndio, logo começam outros. Como estão tendo muitos casos de queimada, ele [o criminoso] aproveita para fazer uma queima que é área de interesse dele”.

A dinâmica, conforme explicitado pelo profissional, consiste no aproveitamento da oportunidade durante a temporada de queimadas. Isto é, devido aos altos casos de queimadas sazonais, seja por manejo integrado do fogo – ou não – criminosos aproveitam para iniciarem manejo do chama individualmente.

Apesar de compreender a dinâmica por trás dos crimes, identificar os autores ainda era um desafio para os agentes policiais. Ventrone relembra um caso ocorrido em novembro de 2024, no Pico das Cabras, onde fica localizado o Observatório Joaquim Egídio. O Museu Aberto de Astronomia foi atingido pelas chamas, levando à destruição de parte do complexo. O autor do incêndio foi identificado e autuado com uma multa milionária. 

Para 2025, o Governo do Estado de São Paulo, junto das forças de segurança, atuam na prevenção contra esses incêndios por meio da “Operação São Paulo Sem Fogo”, além de estarem alinhados com as prefeituras, Defesa Civil, Corpo de Bombeiros e outros entes de Estado.

Infração ambiental contra a fauna e sua dinâmica

Crime ambiental é lucrativo. Um estudo publicado pelo Instituto Igarapé mostra que em 2018 o crime ambiental se tornou a terceira atividade criminosa mais lucrativa do mundo, perdendo espaço “apenas” para o tráfico de drogas e contrabando.

Ventrone reforçou isso, e comentou que ao longo da sua carreira, tráfico e furto de pequenos símios, aves e até gados, são comuns. A prática criminosa vem se aprimorando nesse quesito, ao passo que criminosos falsificam notas fiscais de aves, ou transportam em lugares impróprios por meio do contrabando nas rodovias.

Violência contra animais domésticos também entram nas estatísticas. Recentemente em Bragança Paulista, um homem foi preso em flagrante após a Divisão de Bem-Estar Animal da cidade receber um vídeo do suspeito agredindo o pet. Até “rinha-de-galo”, prática cultural comumente relativizada nas cidades interioranas do Brasil entram nas estatísticas de crimes contra a fauna.

Para adquirir um animal silvestre e domesticá-lo, é necessário toda uma documentação legal. A ave, por exemplo, deve ser proveniente de cativeiro ratificado pelos órgãos de controle, e não podem ser adquiridos da “livre-vontade” individual, retirando os animais da biosfera. 

“Quando uma pessoa faz isso, de pegar uma ave silvestre ao bel prazer, está impedindo aquele animal de cumprir sua função natural, e prejudicando toda a cadeia da biodiversidade”, comentou o capitão Ventrone.

As consequências das ações de hoje no mundo de amanhã

Deus pode cuidar, mas não pode salvar essas árvores dos tolos”, frase do naturalista John Muir em uma campanha para preservar o Parque Nacional Yosemite em 1897. A sustentabilidade não era o foco dos governos da época, o que levou Muir a proferir a frase popular. 

Hoje, em 2025, o Estado oferece aparelhos para mitigar essas práticas, como a queima ilegal, com potencial de causar danos a saúde a toda a flora ou à fauna. A polícia por exemplo incentiva a denuncia ao 190. Ventrone destacou que a participação civil de denunciar no 190 casos suspeitos ou flagrantes de crimes contra a natureza devem ser constantes.

A participação civil para debater as crises climáticas dão passos curtos em comparação ao avanço tecnológico e industrial. Apenas em 2009 o Brasil instituiu a Política Nacional sobre Mudanças do Clima (PNMC), instituída pela lei 12.197/2009, e, somente em 2016, entrou em vigor o Acordo de Paris, assinado na COP-21 – um comprometimento dos líderes mundiais em manter aumento médio da temperatura global em menos de 2ºC.

Para Bruna Locardi, as consequências são reflexos direto das mudanças climáticas, como por exemplo passar por períodos de seca intensa e, ao mesmo tempo, com excessos de chuva. Esses eventos, como a inundação de um bairro inteiro em 10 minutos, se tornarão mais comuns. As chuvas e enchentes ocorridas no Rio Grande do Sul ano passado, e em São Paulo há semanas, são exemplos disso:

“O problema é que muitas pessoas não conseguem lidar com uma mudança tão significativa no pensamento. Elas negam a realidade porque não se sentem preparadas ou capacitadas para aceitar essa nova forma de ver as coisas. A abordagem sempre foi reativa, e a maioria das pessoas não está acostumada com o planejamento, mas sim com ações imediatas. Porém, lidar com as mudanças climáticas exige um planejamento adequado.”


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Autor

  • Iago Yoshimi Seo

    Jornalista de profundidade, autor do livro A Teoria de Tudo Social: Democracia LTDA., ambicioso por política e debates

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