Compartilhar uma data comemorativa parecia apenas parte da rotina de um servidor público em Guarujá, na Baixada Santista. Mas, ao postar sobre o Dia do Orgulho LGBTQIAPN+ no grupo de trabalho, ele foi removido pelo chefe e viu suas mensagens desaparecerem. “É 2025. Ainda precisamos pedir licença para existir?”, questiona.
Imagens enviadas à Reportagem mostram o momento em que o funcionário, de 37 anos, é excluído da conversa virtual pelo diretor-presidente da Guarujá Previdência, o instituto de previdência dos servidores municipais. Desde então, ele teme represálias no ambiente de trabalho e espera ser incluído novamente no grupo, já que é o jornalista responsável por compartilhar comunicados oficiais.
Em nota, a Prefeitura de Guarujá informou que foram abertas sindicâncias com base nas versões das partes envolvidas e ressaltou que realiza campanhas frequentes contra qualquer tipo de discriminação, além de ter seus órgãos de controladoria em sintonia com a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania. A defesa do diretor ainda não foi localizada pelo VTV News até o fechamento desta matéria, mas o espaço para manifestação segue aberto.
“Não era para ser uma questão”
Segundo o boletim de ocorrência (BO) registrado pelo servidor, suas funções incluem comentar datas e eventos de interesse institucional. No dia 28 de junho, ele compartilhou no grupo uma publicação da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o Orgulho LGBT+ e, em seguida, um conteúdo do Supremo Tribunal Federal (STF). Ambas as mensagens foram apagadas pelo gestor da autarquia no grupo de WhatsApp (veja a seguir).

Acostumado a compartilhar datas relevantes no grupo de trabalho – como o Dia do Doador de Sangue e a Consciência Negra – o profissional ficou surpreso com a reação do diretor-presidente.
“Nunca fui questionado antes. Agora, de repente, me perguntam se eu quero ‘doutrinar’ servidores, como se postar fosse ensinar alguém a ser gay”, desabafou. Ele trabalha na Guarujá Previdência desde 2016.
“Foi muito bizarro porque eu não escrevi nada. Apenas compartilhei uma publicação do STF sobre direitos humanos”, disse o servidor, que é jornalista, atua como comunicador institucional e se identifica como integrante da Comunidade LGBT. “Estamos em 2025, não era para isso ser uma questão. Não gosto? Finge que não vê. Ele teve o impulso de me remover e apagar as publicações”. Segundo ele, o diretor-presidente é comissionado.
Desde o episódio, ele não retornou ao grupo, mas afirma estar preocupado com o clima no trabalho.
“Algumas pessoas se solidarizaram comigo, mas outras preferiram o silêncio. Estou com medo de voltar presencialmente e encontrar o diretor-presidente. Nunca vivi algo assim na minha carreira acadêmica e profissional”. Questionada, a administração municipal informou aguardar o resultado das apurações.

Pedido de home office negado
A situação é agravada por outro impasse: o servidor foi diagnosticado com visão monocular (quando uma pessoa só consegue enxergar com um dos olhos), condição que o classifica como Pessoa com Deficiência (PCD). Laudos assinados por três médicos da Prefeitura recomendaram, em 12 de maio, que ele trabalhasse remotamente, mas o pedido teria sido recusado pelo gestor da autarquia.
“É um ato administrativo vinculado. A administração não pode se recusar a cumprir uma obrigação determinada em laudo médico”, afirmou o advogado Vinicius Vieira Dias, que representa o servidor, ao VTV News. “O agente público não tem a prerrogativa de dizer ‘não vou fazer’. É obrigação cumprir”. O denunciante também aguarda transplante de córnea.
Para Vieira, o caso envolve não só descumprimento administrativo, mas também assédio, uma vez que o servidor está abalado com a situação. “Ele está sendo alvo de discriminações e atitudes negativas por causa da condição sexual. Estamos falando de um ambiente público onde isso é ainda mais inaceitável”, pontuou.